domingo, 4 de abril de 2010

Da Democracia segundo S. Pedro [Arroja]

Pedro Arroja dixit: “Quando a democracia de sufrágio universal me considera igual a um jovem de 18 anos e atribui ao meu voto um peso igual ao dele, aquilo que, na realidade, está a fazer é a depreciar-me, a pôr-me ao nível de um miúdo. E isso eu não aceito. É uma ofensa a mim próprio e a Deus aceitar uma coisa dessas, pois equivale a considerar que tudo aquilo que eu fiz no entretanto não tem valor nenhum. Por isso, eu nunca mais votarei. Eu aceito participar num processo democrático quando os outros eleitores sejam meus pares (como acontece na eleição do Papa, que é feita exclusivamente por cardeais). Ora, eu considero que um miúdo de dezoito anos não é meu par coisa nenhuma. Na realidade, tem idade para ser meu neto.”


in Portugal Contemporâneo


(via Cláudio Carvalho)


PS: Acho piada que todas as pessoas na FDUP depois de tomarem conhecimento da personagem nem se tenham dignado a criticar o senhor. Tudo o que tenho visto até hoje são conversas em que as pessoas se limitam a citar coisas que ouviram ou leram.

20 comentários:

Duarte canotilho disse...

Ary eu acho que, da mesma maneira que há coisas que não se deve comentar pois são insignificantes, as pessoas não comentam o arroja pois ele é insignificante. Que ele é uma besta que julga-se no topo da razão.. é verdade que o é. Mas basta ter ouvido-o no forum para ter esse tipo de opinião

Ferreira Ribeiro disse...

Não acho, Canotilho, que seja esse o motivo. Se fosse tão insignificante não haveria tantos blogues do universo FDUP a citá-lo. E chamar "besta" às pessoas também não é uma coisa muito bonita de se fazer...

Ary, parece-me que as pessoas se limitam a citar porque ficam de tal maneira atónitas com aquilo que lêm/ouvem de Pedro Arroja que nem têm palavras para comentar. As palavras (as dele) falam por si...

D. disse...

Eu critiquei, mas acho que ninguém percebeu que era dele que eu falava :O

Marta Lima disse...

Não acredito que me 'sirva a carapuça' do aparte que foi feito, mas posto que vem na sequência da minha citação, sinto-me no dever de comentar.
Começando pelo facto de não ter assistido à sessão do Forum Politica e Sociedade em questão que, desde logo, não faria de mim a pessoa mais idónea para tecer observações, também o artigo para que remeti já era, por si só, bastante crítico; não obstante, no caso do texto que citei, deu-me a sensação que as minhas ilações não acrescentariam muito à reacção que qualquer leitor dotado do mínimo de bom senso teria quando defrontado com o conteúdo das afirmações em causa.
Por fim, e subscrevendo a ideia de que há 'palavras que falam por si', colocar neste espaço que, sei-o, é frequentado por, se não amantes, defensores da democracia, um texto com laivos bem vincados de autoritarismo, pareceu-me ser sarcástico ao ponto de dispensar adicionais afloramentos.

Francisco disse...

Tens alguma razão no que dizes, Ary. E eu faço mea culpa.

Guilherme Silva disse...

Eu não disse nada porque ele é muito rico (tem inclusive um BMW e um Mercedes) e poderoso, e tive medo que ele enviasse alguém para me tirar a tosse.

Ary disse...

O Guilherme fez-me rir =)

Não uma questão de culpa, Noronha, ou de "carapuças", Marta, é a constatação de que perante algumas afirmações e algumas pessoas nem sabemos por onde começar a criticar.

Acho que tem a ver sobretudo com o seguinte: o esquema mental dele, as soluções dele, o pensamento dele, em suma, está muito bem ajustado aos valores dele, embora muito desadequado face aos nossos - muito diferentes que eles sejam, como aliás já se viu tantas vezes que são.

Estamos habituados a criticar erros lógicos, erros nas conclusões e nos processos que a elas levaram, não estamos habituados a discutir com alguém cuja lógica está correcta mas que parte de pressupostos radicalmente diferentes dos nossos. "O meu voto valer tanto como o do rapaz de 18 anos é depreciador e coloca-me ao nível de um miúdo" Não vemos a sociedade assim, como "níveis" e pessoas de diferentes castas e diferentes dignidades; encaramos a diversidade religiosa de uma outra forma; reconhecemos as legítimas expectativas das pessoas à felicidade e o direito a prossegui-la mesmo por parte de alguns grupos como os homossexuais e as mulheres =)

Claro que a um nível ainda mais profundo haverá de novo base para o diálogo. Os nossos princípios podem ser diferentes, mas os valores dificilmente são diferentes ainda que em ordem desigual. Isso deve ser ao menos algo tranquilizador e constituir uma lição a retirar de grande importância: há sempre uma base de compreensibilidade mútua entre seres racionais.

Manuel Marques Pinto de Rezende disse...

eu, que não sou nenhum amante da democracia - visto ser ela já a amante de muita gente - e nem do autoritarismo, o irmãozinho da anterior, e estou habituado à rightiousness da opinião maioritária, apoio essa afirmação a 100%.

de facto, não me parece que o facto de mil rapazinhos do Bloco que defendem a nacionalização da banca e o aumento dos "impostos sobre a riqueza" tenham mais influência no meu país que um homem adulto que trabalhe, tenha de pagar salários e impostos e manter uma família. não me parece racional, vá lá, chamem-me aristotélico fanático.

até porque esses rapazinhos estão imbuídozinhos de uma culturazinha académicazinha muito portuguesinha, muito feita pela raminha, e cheios da porcaria dos partidos, do discurso ram-ram.

e porque considero que qualquer trabalhador é superior, mil vezes, a cada um desses mil rapazinhos, sou, portanto, anti-democrático e pró-arrojista.

Ary disse...

És um fascista portanto =) Ou um comunista ... isso de os trabalhadores serem superiores soa-me a ditadura do proletariado!

Agora a sério. Não me parece que a frase seja a mais feliz embora traduza a seguinte realidade: nem todas as opiniões valem o mesmo. E isto é lógico para quem assuma que existe qualquer coisa parecido com a Verdade ou com a Justiça ou até mesmo com a mera eficiência: há caminhos mais verdadeiros, mais justos e mais eficientes que outros e se nem todos apontam para o mesmo caminho haverá certamente uns mais certos que outros.

Agora coisa diferente é partir do facto de alguns estarem mais preparados que outros para decidir, serem mais instruídos, por exemplo, e dizer que deve ser o círculo dos mais instruídos a governar o destino de todos.

Em primeiro lugar deparamos-nos com um problema de ordem prática que é de avaliar quanto valeria o voto de cada um consoante um sistema que tomasse em conta as desigualdades de todos. Mesmo entre os que estariam razoavelmente preparados para decidir das matérias da "polis" haveria cidadãos com graus de preparação diferentes, que injustiça! Onde traçamos a fronteira? "O senhor tem 2 votos, o senhor 4, o outro ali 5,5, os outros caladinhos..."

Ary disse...

Outro problema de ordem prática é o da imposição de um sistema em que pessoas interessadas não sejam ouvidas. Além do mais "no taxation without representation!" como podem querem que parte da sociedade tenha o suportar parte do peso a ela inerente - seja ele sobe a forma de uma lei, de um imposto, de uma expropriação, de uma guerra - sem ser ouvido na decisão? Se eu vivo num sistema em que não tenho a hipótese de ser ouvido e sem que nunca vou ter acreditem que me vou chatear a sério um dia.

Outro aspecti prático: as sociedades nasceram do fenómeno da interdependência e a ele continuam intrinsecamente ligadas. Já não me lembro quem dizia que Deus fizera o Homem de tal modo a que um só não conseguisse subordinar os demais pelo mais que tinha em força ou em inteligência. Esta é uma constatação interessante: ninguém está a salvo, ou como dizia JFK "uma sociedade que não consegue ajudar os muitos que são pobres, não conseguirá salvar os muitos que são ricos". Sem um sistema que dê voz a todos dificilmente conseguiremos passar sem umas quantas revoluções que a ninguém beneficiam.

Mais uma questão: dificilmente esse conselho de sábios legislaria para o bem comum, dificilmente, sem o controlo do povo, resistiria à tentação de legislar para si mesmo. Essa é uma perspectiva muito individualista, muito liberal, muito conservador até, talvez, mas acertada: a natureza humana facilmente se deixa levar por impulsos egoisticos se souber que o pode fazer impunemente.

Deopis nada nos garante que os sábios estejam certos. Pelo contrário, a diversidade de opiniões não poderia ser maior aí. As pessoas que tenderíamos a excluir têm geralmente um conjunto de opiniões mais ou menos iguais, mas os sábios não, têm todos ideias bem diferentes uns dos outros. Pelo mesmo raciocínio de há pouco não podem eles estar todos certos, logo não parece haver assim tantas vantagens em colocar neles o poder de decidir.

Também não esqueçamos o poder da persuasão. Muita gente pode não perceber a fundo das questões, mas avaliar com o mínimo de racionalidade um dada questão. Muitos ignorantes têm a mesma opinião que alguns sábios e pode vezes são das questões melhores julgadores porque viram mais e pensaram menos (muito Alberto Caeiro).

Mas mais importante que essa é a constatação de que estamos todos no mesmo barco e temos apenas a certeza de ter todos uma vida para gastar - o mais, se vier, é bónus - é um insulto à dignidade de seres pensantes obriga-los a viver no seio de comunidades que ele não pode aspirar a inspirar. Esta não é uma questão prática, é uma questão ética: até que ponto é legítimo, é bom, retirar a cidadania a alguém que no âmago não difere assim tanto de nós e para o bem e para o mal vai ser influenciado pelas decisões que tomamos.

O pensamento autoritário e anti-democrático é profundamente paternalista, profundamente descrente das capacidades humanas, profundamente pessimista relativamente à essência do Homem e nessa medida profundamente anti-liberal naquilo que o liberalismo tem de melhor.

D. disse...

Já que o arroja é tão directo, eu vou também ser e assim já fica a crítica bem percebida: o gajo é um atrasado mental. pumbas!

Manuel Marques Pinto de Rezende disse...

Eu não tenho alguma descrença nas capacidades humanas.
Sou activamente personalista, até.
Mas a democracia, enquanto processo que atomiza o indivíduo até o tornar numa fracção, num voto em 10 milhões, inspirado na regra da maioria, não me parece nada o culminar de um processo civilizacional.
Muito pelo contrário, parece-me retrógrado.

O homem-número é muito menos livre, muito mais incapaz e infinitamente mais observado e regulado que o homem do século XVI.

O fascismo é puramente democrático nesse aspecto.
Baseia-se em manifestações populares, nos favores da maioria, na criação de insititutos públicos de educação e manobra da Massa, da estupidificação da cultura dos povos para incluir tudo isso no folclore que o regime permite.
Eu vejo isso acontecer na nossa democracia.
Além disso, líderes como Salazar (supondo erroneamente que este era totalitário ou fascista), Hitler, Estaline, Mussolini, Fidel Castro, Hugo Chavez, caso se dessem ao trabalho de levar os seus povos às urnas, teriam ganho, sem sombra de dúvidas, todas as eleições que quisessem sem fazer batota.

A ideia de que uma maioria pode personificar num homem, que a levará a vencer sobre a minoria (muitas vezes dos 49%) essa sim é paternalista. É o pior lado dos paternalismos. É o pai que prefere um dos filhos e o ajuda a dar porradinha velha no outro.

O fascismo e o comunismo enquanto fenómeno revolucionário de massas, é democrático.

Eu, nesta ordem de pensamento, serei reaccionário.

Manuel Marques Pinto de Rezende disse...

"Mais uma questão: dificilmente esse conselho de sábios legislaria para o bem comum, dificilmente, sem o controlo do povo, resistiria à tentação de legislar para si mesmo. Essa é uma perspectiva muito individualista, muito liberal, muito conservador até, talvez, mas acertada: a natureza humana facilmente se deixa levar por impulsos egoisticos se souber que o pode fazer impunemente."

esta tua forma de pensar, Ary, revela um profundo desocnhecimento de tudo o que se passou antes da criação dos moldes de governo representativo do século XIX.

é como pensar que antes da rev. francesa a europa estava polvilhada por tiranos.

tens a certeza que a humanidade não criou outros institutos, outros mecanismos, que assegurassem a representatividade dos homens, e a aplicação do bem-comum pelos soberanos?
coisas como a religião, as confrarias, as comunidades, as freguesias, os cultos, as leis locais, o poder local, etc. etc.

é dificil, para nós kantianos, imaginar que o mundo estava cá em 500 dC, ou 400 aC, ou 1200, ou até 1757.

mas estava, e as pessoas queriam ser tão livres como agora.
e penso que em muitas coisas, eram mais livres e felizes que nós agora somos.

Ary disse...

Antes da Democracia acredito na Justiça, sem dúvidas ou hesitações. O culminar do nosso processo civilizacional não é o Estado Democrático, o Estado de Direito Democrático, ou o Estado de Direito Democrático Social, eventualmente o Estado de Direito Democrático Social e de Cultura.

Mas isso é outra coisa. Quando te falo de alhos não respondas com bogalhos =)

Ary disse...

Parece-me uma vez mais que os nossos manuais de história não são os mesmos, mas essa já é uma questão velha.

Manuel Marques Pinto de Rezende disse...

eu só te estou a falar do aspecto democrático.
eu acredito nesse culminar, nesse Estado de Direito.
o Estado de Direito Democrático Social e de Cultura não faço ideia do que seja.
arrisco dizer que se assemelha à criação de Mussolini, a Reppublica Sozzialle.

Ary disse...

O que vale é que só duas ou três leitores fazem ideia o que seja o EDDSC mas acredita que não tem nada a ver com fascismos. Aliás se o Google não sabe provavelmente nem existe =) Se chegaste até ao Estado (...) Social então basta colocar-lhe preocupações de índole cultural, como o problema do acesso à cultura, da diversidade cultural, da responsabilidade do Estado não apenas em formar indivíduos com competências, mas igualmente com conhecimentos que lhes permitam apreciar a arte nas suas diferentes formas de expressão, valorizar a criação artística como realização humana, etc. É uma coisinha muito vaga criada por um alemão velho, deixa lá =) Além disso o aspecto "Cultural" vem só depois de termos garantido os outros por isso não é, nem para ele, uma prioridade.

Tomás Gonçalves da Costa disse...

"da responsabilidade do Estado não apenas em formar indivíduos com competências, mas igualmente com conhecimentos que lhes permitam apreciar a arte nas suas diferentes formas de expressão, valorizar a criação artística como realização humana, etc."

Este etc... mete-me muito medo. E não posso deixar de concordar com o manel que tal Estado tem muitas semelhanças com criações anteriores que utilizaram a Cultura para influenciar a sociedade.

Ary disse...

Já estou como a Liliana: "estou quase a chamar os homens das batas brancas". Para me levarem a mim ou a vocês é que ainda não sei.

DC disse...

Não li tudo, por falta de tempo para o fazer, mas ao não votar, a opinião dele não vai passar a valer menos do que a do miúdo de 18anos que vota?

É que pelo menos esse, bem ou mal, exprime a sua opinião através do voto, voto esse que tem poder para alterar a ordem vigente.
Ao abdicar do direito de votar, abdica também do poder de voltar a que as coisas sejam como ele gostaria que fossem ou não?

Enviar um comentário