Para aqueles que vêem nos académicos figuras de neutralidade farisaica, homens de sobretudo escuro escondendo (ou, pelo menos, disfarçando) ideias e convicções pessoais em nome de uma pretensa verticalidade e sapiência ímpares (que não deixam de ter, em todo o caso), distantes do terreno, da realidade, da "prática" (termo que enche tantas bocas e tão poucas cabeças), fica o convite à leitura do excerto abaixo. Sem prejuízo, note-se bem, da posição intelectual dita "académica" ser tão legítima e fecunda (muitas vezes bem mais fecunda!) como a de posições politica ou ideologicamente vincadas e publicamente manifestadas.
nota1: O excerto insere-se nas lições do Professor Figueiredo Dias relativamente à construção dogmática das consequências jurídicas do crime, no que às Medidas de Segurança (como instrumento político-criminal sancionatório sob monopólio judicial do Estado) diz respeito, assim como à sua maior ou menor dificuldade de incorporação no sistema penal, lado a lado com as Penas (daí a controvertida questão a propósito de um sistema "monista" ou "dualista" a que o excerto alude).
nota2: a nota1 não pretende ser (longe disso!) qualquer apontamento penalístico em passo rápido, mas simplesmente uma necessária (e básica) contextualização do tema para quem visitar este blog e não estiver familiarizado com o estudo do Direito.
A "administrativização" das medidas de segurança encontrava apoio claro na evolução por elas sofrida entre nós no período do chamado Estado-Novo, nomeadamente, pelas que eram aplicadas aos delinquentes políticos.
Isso explica, por um lado, que muitos autores, que inicialmente tenham dado o seu aplauso à ideia da integração no sistema penal das medidas da segurança, tenham passado posteriormente a combatê-la. Como explica, por outro lado, que penalistas fiéis aos ideais democráticos tenham tentado expurgar do campo do direito penal a problemática das medidas de segurança, como forma - todavia perversa - de manter incólumes os princípios fundamentais da teoria e da política criminais; ao mesmo tempo que advogavam a consagração de um sistema monista, como forma de ilegitimar a aplicação de medidas de segurança a imputáveis e, por conseguinte, a delinquentes políticos. É óbvio que todas as motivações deste tipo se encontram hoje ultrapassadas pela Constituição democrática do Estado português e não devem, por isso, desempenhar qualquer papel nas orientações político-criminais e dogmáticas do momento presente.
Direito Penal Português - Parte Geral II - As Consequências Jurídicas do Crime, Jorge de Figueiredo Dias
filhos da Duna
Há 3 dias
2 comentários:
Onde é que eu já li (ouvi) isto? :))
Bom post.
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