1. Pareceu-me ver um exemplo de como dois diferentes ramos do Direito recorrem a um expediente idêntico, embora com diferentes designações. O que, porventura, à luz do tal princípio da ordem jurídica, não seria desejável. No caso, refiro-me à discricionariedade do Direito Administrativo e à livre apreciação da prova do Processo Penal.
2. Pontos comuns.
Em ambos os casos...
a) intervém uma entidade pública que, por acto de autoridade, acaba por definir a esfera jurídica de um ente, para estes efeitos, privado.
b) tais poderes derivam da lei
c) começou por entender-se que naquilo que a lei não previsse, o aplicador teria uma liberdade "desvinculada". No caso do Direito Administrativo, esta interpretação do princípio da legalidade reinante no século XIX veio a ser infirmada; no Direito Processual Penal, encontrei o mesmo entendimento no artigo do Dr. Medina de Seiça inserto no Liber Discipulorum de Jorge Figueiredo Dias, seguindo diferentes autores.
d) passou-se desse período em que o indivíduo era apenas um objecto - do acto administrativo ou da decisão do julgador - a um outro, em que o indivíduo passa a ser um verdadeiro sujeito processual/ procedimental (no Direito Administrativo consagrou-se o direito à audiência prévia dos interessados, na qual estes poderão oferecer o seu contributo para a decisão final; no Direito Processual Penal consagra-se o princípio do contraditório)
e) considera-se que o aplicador está sempre obrigado a encontrar a melhor solução em concreto e, onde não haja previsão legal, está limitado por um conjunto de princípios gerais de Direito - nem que, apenas, de racionalidade.
Posto isto, não será que a discricionariedade e a livre apreciação da prova do 127.º do CPP são duas designações para a mesmíssima realidade: um tipo específico de poder, conferido pela lei, que caracteriza actos de autoridade públicos? (com outras especificidades, naturalmente. A definição do poder teria de ser trabalhada).
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