sexta-feira, 21 de agosto de 2009

Liedson

A recente novela em volta do Liedson, já repetida, pelo menos, com Deco e Pepe, e não, curiosamente, com Obikwelu, faz-me lembrar o "Gangues de Nova Iorque", de Martin Scorcese. Vêm os irlandeses chegando a Nova Iorque e, não obstante se poderem tornar cidadãos americanos (e de, alguns, lutarem na guerra civil americana...), são recebidos à pedrada pelo nativos, chefiados pelo Talhante.

É o velho artigo da "Animal Farm" de Orwell. "Todos os animais são iguais, mas uns são mais iguais do que outros." Como se isto de ser português de gema tivesse alguma coisa que ver com o primeiro bilhete de identidade que se tem.

Post scriptum: os nativos do "Gangues de Nova Iorque" eram netos ou bisnetos de emigrantes.

20 comentários:

Hugo disse...

Gostava de concordar tão facilmente.

Falando de futebol pelo menos(e que com pena não se questiona noutras modalidades), a origem e o encanto das equipas nacionais está no facto de poder existir um jogo de choque de culturas. Mais simbólico do que propriamente competitivo porventura(nos primórdios eram amigáveis que se disputavam).

Ver a espectacularidade brasileira contra a organização alemã. Ver o cinismo italiano contra a fúria espanhola. A garra inglesa contra a frieza russa. A magia africana contra os rápidos japoneses...

Enfim, uma espécie de duelo civilizacional e cultural...

Por outro lado, fará isto hoje sentido? Haverá alguma sociedade que se mantenha pura? Será isso sequer aceitável de se propor? Porque não questionar o Bosingwa ou o Eusébio já agora?

O que mais gosto é de ver o choque de culturas entre selecções nacionais, provavelmente é apenas um hábito antiquado e nacionalista do futebol...

Ver Liedson, pepe, deco contra a selecção alemã com um brasileiro(kuranyi) dois polacos(podolski e klose) ou até um africano(asamoah ou owomoyela ou odonkor), não me choca por serem de determinada nacionalidade, mas por desvirtuar estes confrontos épicos de culturas.

Mas é algo com tendência a prosseguir, não é uma questão sequer do futebol, e sou do mais partidário que pode haver a abertura de fronteiras...no futebol custa-me pelas razões que apresentei...talvez fosse preferível então fazer um confronto de ligas...A selecção da liga espanhola contra a liga inglesa, contra a liga portuguesa...talvez seja esse o futuro dos futuros, ou até uma competição alternativa apetecível!

TR disse...

Pois...o problema é o ponto para que, a dada altura, alertas: trata-se de manter uma conjunto de equipas que representam uma "pureza cultural" que não existe nos países que representam..

Ary disse...

O Estado Nação é uma ilusão absurda nos tempos que correm.

A pureza cultural não existe já na esmagadora maioria dos países e por muito nostálgica que possa ser a sua perda acho que ganhos mais com o seu fim.

Para mais em Portugal nunca fez sentido falar de purezas culturais, os étnicas, os civilizacionais. Somos rafeiros desde que somos alguma coisa.

Hugo disse...

mas concordo totalmente ctg ary. Não faz sentido. Mas acho que era esse choque cultural(que se desvanece) que dava encanto aos jogos entre equipas nacionais.

TR disse...

Certo Ari. Daí que tenha posto "pureza" entre aspas;)

Ary disse...

Hugo, concordo.

E mais: confesso que não gosto de ideias estranhas como aquela da fórmula 1 com equipas de futebol.

Duarte Canotilho disse...

Eu concordo plenamente com o post do tiago. Liedson é luso-portugues, logo pode ir a selecção. Não precisa de ser portugues de gema. Já viram a selecção francesa que nos ganhou em 2000? Essa tinha 60 por cento de naturalizados.

Olha sinceramente, e tendo em conta que esamos num mundo globalizado, a tal "pureza" é cada vez mais complicada. Pois será que os filhos dos emigrantes ficam com alma portuguesa instantanea ou furia espanholam ou cinismo italiano? Não são eles também "quase naturalizados"...

Ary disse...

Então está tudo de acordo? É tudo universalista por aqui? Não há nenhum velho do restelo a dizer que antigamente é que era quando não podia haver mais que um estrangeiro a jogar no campeonato nacional? =P

DC disse...

"A espectacularidade brasileira contra a organização alemã. Ver o cinismo italiano contra a fúria espanhola. A garra inglesa contra a frieza russa. A magia africana contra os rápidos japoneses"

Isto não faz grande sentido, porque para além de ser verdade nas selecções desses países, também o é nos campeonatos respectivos, como tão bem podemos atestar nas competições internacionais de clubes.

Quanto à questão de utilização de jogadores naturalizados nas selecções, não me faz muita espécie, e não deixa de ser curioso que só se levante esse nacionalismo em relação ao futebol, ou será porque Portugal não tinha atletas de 100e200metros, nem salto em comprimento, nem no ténis...

Será que o Manuel da Costa, ou até um miúdo que se estreou pela selecção portuguesa e que julgo era luso-francês, ou franco-lusitano, têm alma de portugueses, apesar de nem a língua dominarem?

Hugo disse...

Bosingwa nascido no Congo
Rolando, nelson e nani Cabo Verde
Daniel Fernandes, Canada
Danny, Venezuela
Djalo, Guiné-Bissau

Estes são alguns exemplos...

No entanto a diferença para Pepe, Deco ou Liedson é que tem uma ligação extra-futebol a Portugal...talvez daí não tenha havido discussão...Ou então não eram importantes o suficiente...

E para aqueles que dizem que é por serem brasileiros...com esta novidade dos argentinos vai acontecer algo semelhante...Tem a ver com a qualidade do mercado...não com a nacionalidade.

D. disse...

eu vou ter de discordar... a questão em relação a ter os jogadores naturalizados a jogar na selecção é que, e não me digam que ainda não repararam, eles optam pela selecção nacional quando a selecção do país deles lhes vira as costas. ou seja, estão ali apenas porque é uma bela forma de aumentar a projecção internacional. e é óbvio que toda a gente vai falar da questão de que já não existem jogadores com amor à camisola, mas então eu devo confessar que pelo menos em relação às selecções, gostaria de ter jogadores que jogam com amor à camisola e não apenas em troca de projecção. e se é verdade que existem muitos jogadores portugueses que também se estão a marimbar para a selecção, ter jogadores que se naturalizam porque foram renegados pela equipa do seu país é hilariante. e isto funciona para todos, sejam eles de que clube for.
agora, se a questão se põe em relação a jogadores que embora nascidos noutro país passaram grande parte da sua vida cá e sentem que pertencem mais aqui do que propriamente ao país do qual são nacionais, então já é uma história totalmente diferente. aí é óbvio que faz todo o sentido que o jogador possa jogar pela selecção portuguesa.
mas devo confessar que a selecção não me aquece nem arrefece, logo, por mim até podiam ter uma selecção só de jogadores esquimós xD

p.s - sinto que repeti a palavra "questão" um milhar de vezes.

Hugo disse...

A Daniela tem muita razão em muitos pontos que refere.

O Pepe foi o único que disse que preferia Portugal...(até porque a sua chamada para selecçao brasileira acabaria por chegar rapidamente, basta ver que lá está o luisão). Mas o Pepe veio para cá com idade de júnior. Tal como o Deco que praticamente não conheceu outro futebol profissional que não o português.

O caso do Liedson, e de naturalizar um brasileiro de 31 anos, com meia dúzia de anos em Portugal...por mim não!

Existem selecções nacionais para existirem identidades em confronto...assim deixará de fazer sentido!

O argumento legal está lá, sim...liedson é tão português como eu...Mas há que procurar as raízes da origem dos jogos entre selecções, perceber qual o seu fundamento! e esse não é ter atletas que cá estão há 5 ou 6 anos, que podem gostar de portugal mas não sentem portugal... E é por isso que ainda gostamos de ver os Lobos a berrar o hino(se bem que lá também jogam alguns nacionalizados, mas isso não interessa nada). No desporto temos destas coisas...Fica-me assim tão mal admitir que vibraria muito mais com o Carlos Lopes do que com o Obikwelu? que nem português fala...Ser português legalmente é uma coisa, representar o país desportivamente parece-me outra(porque essa é a razão dos jogos entre nações, que dessa forma perde razão de ser).

PS: Sei perfeitamente que no futuro assim será, o mundo assim o exigirá, mas vou.me sentir sempre um pouco nostálgico se um dia vir uma selecção portuguesa como a francesa de 98 ou 2000...Mas, a selecção é de todos nós!! :D

TR disse...

Concordo com o DC.

Para evitar o que a Daniela diz, há modalidades, como o futebol, que impedem que o mesmo atleta represente duas selecções nos seniores (é assim, não é?). Mas isso vem das federações internacionais. E, provavelmente, para evitar o que acontece, por exemplo, no atletismo, em que se "compram" atletas.

De resto, não vejo como ainda seja defensável dois critérios diferentes para além do "argumento saudosista" do Hugo :P. Parece-me uma injustiça, na verdade.
Suponho que a maior parte das vezes que alguém se naturaliza não seja por adorar o país que a recebe, mas sim por motivos bem mais comezinhos. Não me choca que também um futebolista, reunindo as condições para se tornar cidadão (e seis anos em Portugal é, porventura, uma ligação, "extra-futebol" mais forte do que, por exemplo, ser filho de alguns emigrantes).. se torne!

(Embora esta parte não se preste ao debate, eu vibrei tanto com o Obikwelu em Atenas como com a Vanessa Fernandes em Pequim, ou o Nélson, agora, em Berlim - o ano passado não vibrei por não ver em directo.
Voltei a vibrar pelo Obikwelu este ano: em campeonatos internacionais já não corre individualmente, corre só nas estafetas, isto é, por selecções, por Portugal. Ele que, eventualmente, ainda tinha corpo para chegar à final dos 100m...)

Street Fighting Man disse...

uma selecção deve ser o reflexo do povo que representa. Se enguiçássemos com os mestiços ou com os estrangeiros que vivem em Portugal desde que se lembram estávamos bem lixados. nós e os países cuja identidade nacional se criou à base da migração de outros povos. a questão para mim são 'as outras selecções', neste caso, brasileiras. porque encontramos um brasileiro naturalizado a jogar por quase qualquer selecção. jogadores que pelos mais diversos motivos julgam estar atrás na corrida a um lugar na selecção brasileira, preferindo dar o salto internacional adoptando a nacionalidade do país onde joguem, por exemplo. mas não falando só de futebol: se a memória não me falha a dupla de vólei de praia feminina do cazaquistão são duas brasileiras que nunca lá puseram os pés. e isto é desvirtuar por completo a lógica das selecções.
quanto ao liedson, veio para portugal homem feito e como homem feito fez carreira em Portugal. Não é dos muitos que chegam cá como promessas e poucos anos depois fogem para longe a troco de balúrdios. Adquirindo a nacionalidade portuguesa no caminho, alguns, e fazendo carreira lá fora. Como desportista o liedson deverá ficar por cá; depois disso quem sabe? mas será correcto deixar um português representar a selecção nacional em função do sítio para onde ele for morar depois de deixar de dar uns chutos na bola?

Manuel Marques Pinto de Rezende disse...

haverá, de facto, algo a reprovar num jogador que quer apenas projecção internacional?

eu, quando vou ver um jogo internacional, estou espcecialmente atento ao jogo, ou ao orgulho de ter a minha nação aos pontapés à bola?

e se tenho esse orgulho, que orgulho poderão ter os cazaques, se a sua equipa de voleibol é formada apenas por meninas brazileiras que nunca foram ao país dos cazaques, o cazaquistão?

eu, por mim, "nacionalizava" o hulk e punha-o a jogar na selecção, visto que o hulk mete o liedson no bolso de trás das calças, limpinho. de facto, onde foi que hulk se mostrou? em portugal, não foi? então, merece tanto como o cristiano um lugarzinho na selecção de portugueses.
agora, obviamente, não há interesse em ter uma seleção de brasileiros ou cabo verdianos ou angolanos ou etc. da ponta aos pés da equipa nacional.
por duas simples razões, muito simples:
a primeira é lógica - tiraria todo o interesse ao espectador, e a selecção perderia fâs. se eu quero ver um jogo com uma equipa super multi-nacional, basta ver o FCP ou o SLB.
a segunda é meramente ética: após anos de colonialismo opressivo, séculos diria, seria um cirme obrigar brasileiros, angolanos, cabo-verdianos e etc a trajar de verde e vermelho. para isso temos a ana malhoa e o cristiano ronaldo.

Hugo disse...

Exactamente tiago. Bem definido. "saudosista"

:D

D. disse...

hugo, não te esqueças que o Obikwelu está cá desde miúdo e portanto, é normal que ele prefira muito mais portugal do que outro país qualquer.
tal como tinha acontecido com o pepe que também veio bastante novo para cá. mas a partir do momento em que tivemos por seleccionador o scolari, creio que agora não há muita moral para barrar a entrada deste e daquele. e sinto que é precisamente por esse "mercenarismo" da selecção, que deixei de ter qualquer tipo de emoção com os jogos dela.

DC disse...

O Obikwelo veio para Portugal com 17anos, julgo eu, com uma delegação do seu país de origem, para participar numa competição internacional. Ficou por aí a trabalhar nas obras até que foi descoberto?

A ligação especial dele com Portugal advém do facto de ter sido explorado nas obras? É isso que o distingue dos jogadores de futebol naturalizados?

Eu não deixo de vibrar com a minha selecção por ter alguns jogadores naturalizados, ou que não nasceram em portugal, pois caso contrário nunca teria vibrado com a selecção...

TR disse...

Sim, DC, veio por volta dessa idade para participar num campeonato mundial de juniores (acho que é este escalão) pela Nigéria. Campeonato do qual fugiu.

A gratidão do Obikwelu a Portugal é, segundo a versão oficial, por ter podido, cá, reerguer a sua vida e voltar ao Atletismo.

João Fachana disse...

Não tenho nada contra haver atletas naturalizados a participar em selecções nacionais, têm nisso o seu direito.

já me faz confusão é quando essa naturalização só é causada para o atleta poder jogar pela selecção.

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