terça-feira, 7 de abril de 2009

Mão do Mercado

A mão do mercado não é apenas invisível, é também invisual.

Almeida Santos

13 comentários:

D. disse...

loooooool. brilhante :p

Manuel Marques Pinto de Rezende disse...

é como a Justiça. Boas coisas partem de pessoas cegas e invisiveis.

No entanto, nem a deficiência visual impede que ande sempre a mesma tropa a "bater no ceguinho".

Ary disse...

Sabes que as representações da Justiça cega são relativamente recentes. Reza a lenda que da primeira vez o objectivo não era dizer que ela era imparcial, até porque nessa altura ainda havia diferentes foros e tal não faria tanto sentido.

Geralmente uma deficiência visual profunda impede os seus portadores de se defenderem, quanto mais de atacarem. Agora se tens um cego que pega em armas contra quase 100% da população mundial, que anda a ser tramada em maior ou menor escala por um tal de Mercado, parece-me que bater no ceguinho é um caso de legítima defesa, tanto do próprio como, no meu caso, sobretudo de terceiros.

Manuel Marques Pinto de Rezende disse...

Palavras dignas de um socialista.
Palavras que arrepiariam o próprio Keynes.

Ary disse...

Mas não é o que eu sou?
O Keynes só ficava arrepiado de emoção ...

Canoas o mercenário disse...

Ya ary tens razao. A justiça era uma figura de olhos bem abertos, e com uma balança desnivelada....

E sim manel.. dado que o mercado me lixou a mim, sem eu sequer me ter metido com ele, devia ser possivel a mim obter uma indemnizaçao por danos patrimoniais, e não patrimoniais(nomeadamente, o facto de por causa da crise ter de andar aí ao tio ao tio...)

Eu nunca pedi para fazer parte do mercado, é um contrato de adesão que me foi imposto, e que eu não tenho hipotese sequer de resolver, e sem caducidade....

Manuel Marques Pinto de Rezende disse...

vocês falam do mercado como se fosse um senhor chamado João Mercado que é muito mauzinho para os meninos (que estão muito mal na vida, diga-se de passagem, e nota-se pelas olheiras e pelo mau aspecto)

se se queixam do sarilho em qu o mercados vos meteu, olhem duas vezes em quem querem culpar.
esse mercado que vocês dizem que vos lixou, começou a entrar em crise no sector financeiro americano, o sector mais regulamentado do mundo económico.
12 mil funcionários fazem 7mil páginas de regulamentação para o Fed, e nem tudo são cartoons ou fotografias.

a falta de responsabilidade e a enorme falta de bom senso do Mercado, obviamente culpável, foi subsidiada por políticos e burocratas, que criaram no mercado americano incentivos que distorceram o funcionamento regular do mercado, esse bicho mau no qual os encarregados de educação do Canotilho esqueceram de inscrever.
Ganância sempre houve, só que desta vez foi demais por causa de políticas muito cegas, e demasiado visíveis.

quanto ao senhor das incrições no mercado que se sente muito injustiçado, o mercado é bem mais democrático do que tu. é que o mercado livre, ao fim e ao cabo, dá-te oportunidades que não te dá o mercado de estado, a não ser que sejas de um partido daqueles bonitos, e caso não queiras fazer parte dele, tens uma solução muito prática.

despes a roupa sacoor, botas fora com as sapatilhas da converse, vai o polozinho de levar aos acampamentos do bloco, e permaneces com o casaco de pele "handmade"!, diga-se de passagem, e vais viver para uma caverna, que lá não terás de vender nem comprar nada, nem trabalhar para alguem ou ter alguem a trabalhar para ti.

Ary disse...

Em primeiro lugar, ninguém aqui te deve nada. Portanto não sei onde foste buscar a atitude, a disposição e a vontade para escrever um comentário tão agressivo.

Creio que foste o primeiro a tratar o Mercado como se fosse um senhor no teu primeiro comentário. Não fui eu, não foi a Daniela, não foi o Cantoilho, nem o Pai Natal.

Reforço também a ideia já expressa aqui ("legítima defesa, tanto do próprio como, no meu caso, sobretudo de terceiros") eu nem me posso queixar muito das desigualdades mas isso não torna o que eu digo menos verdadeiro. Podes achar que é mais fácil falar de barriga cheia mas a experiência tem-me mostrado que é bastante mais difícil. Quando a barriga começa a encher as pessoas começam a engasgar-se e a achar que se o mundo é simpático para elas não pode ser assim tão antipático para os outros, eles é que são uns preguiçosos que não conseguem fazer mais nada depois de fazerem 2h de viagens e trabalharem em 2 sítios diferentes desde os 15 anos de idade.

O mercado não me lixou a mim. Eu posso partilhar os mesmos 8 metros quadrados de quarto com o meu irmão, mas nasci numa casa cheia de livros, numa família que quando não tinha tempo para mim me deixava com os meus avós, que me pôs a estudar, etc. Se vivêssemos num mundo justo em que as pessoas teriam iguais oportunidades estou em crer que não estaria muito melhor do que estou hoje. Mas é perfeitamente hipócrita eu vir defender o mercado só porque ele foi bom para mim quando ele é mau para tanta gente.

Atenção que eu não disse "fora o mercado". Era impossível, absolutamente, totalmente impossível hoje acabarmos com o mercado e não voltarmos à idade da pedra. É essa a alternativa: ou o mercado, ou a idade da pedra.

Agora um outro mercado é possível. Eu não sou ninguém para te dizer que 7 mil páginas de regulamentação são demais ou são de menos. Sei é que não é com menos regulação que se vão evitar problemas destes e que mais importante do que legislar ou regulamentar é fiscalizar, divulgar boas práticas, etc.

Mais, nem eu, nem o Almeida Santos, nos referíamos à actual crise financeira com a frase. As crises são doenças do mercado e eu não posso levar a mal que ele se constipe, mesmo quando sei que ele andou à chuva e por isso é que agora está assim. Referia-me sim à distribuição quer dos produtos quer dos lucros que é feita pelo mercado. Na minha perspectiva lá porque assim resulta do mercado ele não é nenhum oráculo e não é conhecido por ser justo, mas sim por "fazer as coisas acontecer". O mercado é bom a criar incentivos necessários para que tudo funcione relativamente bem, não é bom a criar resultados justos.

Não temos que nos contentar com o que o mercado nos dá. Aliás, se pensarmos nos riscos que a concentração de empresas ou a cartelização, por um lado, e a poluição e objectificação do trabalho, por outro, então o próprio mercado é auto-destrutivo e um atentado à dignidade da pessoa humana.

A igualdade de oportunidades serve em grande medida o próprio mercado, tanto ou mais que a Justiça. Se o objectivo do mercado é a correcta afectação de recursos e temos pessoas que não estão a dar o máximo da sua contribuição para o mercado porque estão doentes, não tiveram acesso à educação, etc. então este não funciona. Há outra mão que tem de entrar aqui em jogo para garantir o bom funcionamento do mercado: para garantir que todos possam ser os melhores operadores possíveis dentro do mercado.

O mercado é cego porque as pessoas são cegas. A mão é invisível porque somos nós a mão. Somos nós que "ao fazermos o melhor para nós, fazemos o melhor para todos", nas palavras de Adam Smith. O problema é mesmo esse: nem sempre o melhor para nós é o melhor para nós, nem sempre cada um agindo isoladamente consegue os melhores resultados para todos. O mercado é bom, mas não é perfeito. O mercado é cego, porque nós somos cegos. Ou melhor, míopes, vemos apenas o que está à frente do nosso nariz ...

Ary disse...

Desculpa o tamanho do comentário, mas ou me limitava a discordar de ti ou tinha de te explicar porquê.

Manuel Marques Pinto de Rezende disse...

ary, não me interessa nada se o mercado te fez bem ou se te fez partilhar quartos de 8m quadrados.

a verdade é que, se para ti é a mão visível que te proporciona o conforto, e digo-te que não, não é.
a mão visível do estado, ainda para mais num país como o nosso, é uma constante, e só cria mais desigualdade.

e o mercado, inserido numa sociedade de estado de direito, onde se respeite as leis da concorrência e as exigências das populações locais, é o melhor distribuidor de riqueza, não o estado.
o melhor exemplo disso é as supostas social-democracias norte europeias, que estão há de 7 anos dominadas por partidos liberais que reduziram o peso do estado e as regulações. como costumam estar à nossa frente, eram social-democratas quando portugal andava na tourada do Prec, e agora resolveram inscrever a população toda no "João Mercado" e andam os nossos profetas a declamar contra o neoliberalismo que nunca tivemos,perceberam assim os nórdicos que gastos excessivos e créditos baixos são factores de insuportabilidade e instabilidade.

e chateia ver que, ainda, neste lodaçal à beira-mar planttado, continua o medo do mercado. a piadola com o mercado, os pseudo-intelectuais do 25/4 a fazer piada com o facto de terem submetido um país inteiro.

Ary disse...

Há bocado isso parecia interessar-te muito. Quase me dizias que eu não podia falar mal dele porque não ando para aí aos caídos.

Sempre que eu entro numa escola, ando numa rua pavimentada, vou estudar para a biblioteca, assisto a uma aula na Faculdade, vou a um hospital, vejo um polícia a passar na rua, deixo o lixo à porta de minha casa, pego num código, ando de autocarro, acedo à internet, eu estou a ver essa mão visível a distribuir riqueza da forma correcta, distribuindo oportunidades, qualidade de vida e a hipótese de viver uma vida como ela merece ser vivida sem a angústia do dia de amanhã, confiantes de que não é a sorte quem mais ordena e com fé na existência de algum sentido de justiça no universo. É isso que o Estado me dá e o mercado não, até porque a isso não aspira, nem é sua função aspirar.

O mercado ser o melhor distribuidor de riqueza, mesmo partindo de condições irrealistas é uma pura fantasia. É uma infantilidade semelhante à daquelas crianças que dizem aos pais quando eles alegam falta de dinheiro para irem buscar dinheiro "à máquina". O mercado é a grande vaca leiteira, o grande bezerro dourado, a grande Meca, a nova divina providência. Já os ouço: "Se o mercado assim quer", "são insondáveis os desígnios do mercado" ...

FOGO! BASTA!

Mais do infantilidade é preciso má fé ou pura e simples ignorância para andar a citar exemplos que provam o contrário do que pretendes estabelecer.

A tua crença no mercado é como outra qualquer indiscutível porque mercado e Estado interagem de tal maneira que se eu dissesse que o mercado fez isto mal tu dirias que foi o Estado, que "se tivessem deixado o mercado".

Uma vez mais se prova o messianismo por detrás da promessa neo-liberal do Estado sem ... Estado. Nós pecadores, que ousamos duvidar da santidade e perfeição do mercado, estamos agora a pagar pelos nossos pecados. Claro que podemos sempre arrependermos-nos, convertendo-nos ao mercado, perdão, Mercado.

FOGO!

Quanta poeira lançada para os nossos olhos! A troco de quê? Nem o puro materialismo, nem claro egoísmo, nem a falta de um sentido de justiça justificam isto! Só um inconciliável, intolerável, incomportável sentimento de CULPA poderá racionalmente levar alguém a defender tão acerrimamente doutrinas estéreis, derrotistas, insensíveis, brutalizantes, desenraizadas de outro valor que não seja o do omnipotente, omnisciente, omnipresente, HOMENívoro MERCADO.

Tenho dito! BASTA!

Manuel Marques Pinto de Rezende disse...

lá estás tu a ver o Mercado como uma entidade concreta, um João Mercado, um gajo muito antipático que só quer saber dos seus botões.

quando entras numa escola, andas numa rua, acedes à internet, bla bla, estás a usufruir de um trabalho pago pelos contribuintes, representados pelo Estado, que foi pago a preço de mercado (ou assim o esperemos para os pobres coitados dos calceteiros, dos técnicos de internet e assim por aí fora). nenhuma dessas acções envolveu mão visível. tratou-se apenas da prestação de serviços contratados pela comunidade a entidades privadas. isso já havia bem antes de adam smith e durante e após adam smith ainda houve mais.
o problema está em descobrir até que ponto seria mais eficiente manter as relações entre privados livres do poder estatal, e no meu ponto de vista tal deve ser feito o mais possível, e até que ponto é benéfico o efeito de medidas governamentais nas relações entre privados.

porque o dirigismo económico parece ser a melhor solução a curto prazo, mas a longo acarreta consequências que o próprio keynes previu. assim responde ele à pergunta "wouldn't there be problems, in the long run?"
"In the long run.. in the long run we'll all be dead"

Ary disse...

Manuel, como eu previa: sempre que o Estado faz o seu trabalho não é mais do que o seu trabalho, ou pior, o trabalho nem é dele. Assim também eu ...

Eu uso metáforas para tentar fazer-me entender, mas o pior cego é o que não quer ver e eu posso pôr-te tudo à frente, fazer a papinha toda, conduzir-te até fonte, mas não posso obrigar-te a beber. Não queres perceber, tudo bem. Mas então não te finjas aberto ao diálogo.

A questão do curto e do longo prazo é diferente. O mercado tem muitos pressupostos para funcionar bem, nenhum deles possível no planeta Terra, mas mesmo assim ele só funciona no longo prazo: os ajustes só são feitos no longo prazo. Os monetaristas dizem que as crises são saudáveis para as economias, e eu até posso ir concordando. "Afinal tudo se resolve no longo prazo". O problema é que nós vivemos hoje, amanhã, no mês de Abril, em 2009, não num futuro mais ou menos distante em que o mercado retomará o seu equilíbrio.

Eu queria e podia continuar a explicar isto, mas a tua má vontade na interpretação do que eu digo não me deixam muito motivado.

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