segunda-feira, 25 de agosto de 2008

JO2 – Acontecimento desportivo.

(últimos cartuchos sobre JO; desenvolvimento de ideia anterior)

1. Já há uns tempos havia escrito neste blogue um texto sobre a natureza dos jogos olímpicos (http://sociedadededebates.blogspot.com/2008/08/jogos-olmpicos.html). Aí disse que considerava os jogos olímpicos um evento desportivo, e não político. Contrariamente ao que esperava, não tenho a carta olímpica contra esta posição - pelo menos no que toca ao princípios fundamentais. Vejamos o segundo:

“O objectivo principal do Olimpismo é o de colocar o desporto ao serviço de um desenvolvimento harmonioso do Homem, com uma visão promotora de uma sociedade pacífica preocupada com a preservação da dignidade humana.”( http://www.comiteolimpicoportugal.pt/conteudo-detalhe.php?id=16;”

2. Na linha preconizada, os Jogos Olímpicos são uma manifestação eminentemente desportiva que, por essa via, mediatamente influi na realidade política. Assim, é por via indirecta que qualquer promoção de um determinado valor surge. Aproveitam-se as valias do desporto para daí se retirarem corolários úteis na realidade do dia-a-dia. Veja-se, por exemplo, o da igualdade inata entre os indivíduos: nos JO ganhará o que saltar mais alto, ou correr mais, ou pedalar com maior eficiência; a vitória surge não em função da raça, cor, ou afins, mas do trabalho e esforço individual.

3. Daí se conclui que os Jogos Olímpicos não devem ser lidos como um palco político, mas como um grande espectáculo desportivo onde, eventualmente, se possam sentir tensões políticas. Aparentemente não haverá diferença entre uma situação e outra, mas ela existe. É que no primeiro caso tudo se confunde inevitavelmente: A escolha do local será exclusivamente política, os balanços serão políticos, os reflexos políticos. Já no segundo, algumas ilações políticas se poderão retirar, mas por via indirecta.

4. Se os Jogos forem política, apenas política, se procurarem por via directa mudar a realidade, então são traídos pelo seu próprio passado - Berlim 1936; Moscovo 1980. Aí, os Jogos desenrolaram-se em cidades de Estados muito alheios à preservação da dignidade humana (Alemanha essa que procurou restringir o critério de atribuição da personalidade jurídica do BGB, dado este ser, naturalmente, universalista). Nesta linha de pensamento, os objectivos da carta olímpica são letra morta e, sendo-o, não são de valia alguma. Pelo contrário, o ideal dos Jogos, se perspectivados apenas enquanto acontecimento desportivo, não sai chamuscado: continuam a deixar as mesmas imagens de esforço e igualdade entre os atletas (Veja-se Jesse Owens em Berlim), continuam a promover uma sociedade pacífica pelo exemplo do desporto.

5. Não se nega que seja um palco onde se fazem sentir tensões políticas. Naturalmente que a organização de Pequim’08 se afigurou como uma oportunidade para a China se apresentar de nova cara e, formalmente, materializar o que já há anos se anunciava: que é uma potência. Então o que se dirá é que os motivos que levam a China a organizar os JO são políticos, enquanto que os Jogos Olímpicos são eminentemente desportivos. Da mesma forma, quando Portugal organiza a Expo’98 ou o Euro’04 não o faz propriamente para os portugueses terem acesso à cultura ou ao desporto, mas sim para, essencialmente, se projectar na cena internacional. No entanto, a primeira não deixa de ser um acontecimento cultural e o segundo um desportivo, não obstante motivados por razões de ordem político-económica.

6. Firmes os pressupostos do raciocínio, tire-se a última e, afinal, a maior das conclusões: sendo que Jogos não são política, uma boa imagem da China por via dos Jogos não produz ipso facto uma maior avalização do seu papel no mundo. O que ficou provado foi uma tremenda capacidade de organização, de acolhimento dos atletas e de garantia de condições para óptimos resultados. Mas isto é no domínio do desporto, da organização de eventos, do catering e dos souvenirs.
Política estará sempre à parte e direitos humanos manter-se-ão como um prius alheio a demonstrações de força, galante e persuasão. Seria bom, para a China que tudo fosse uma mesma realidade. Mas, raios, não é!

Ver, também:
JO1 – Os puritanos (http://sociedadededebates.blogspot.com/2008/08
/jo1-os-puritanos.html
)

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